Sofia Moser Leitão: “Não sou designer, mas se fosse, adoraria saber que as pessoas se interessam pelo meu trabalho, mas que esse interesse não passasse só de curiosidade e entusiasmo.”
13/05/2022

Sofia Moser Leitão: “Não sou designer, mas se fosse, adoraria saber que as pessoas se interessam pelo meu trabalho, mas que esse interesse não passasse só de curiosidade e entusiasmo.”

O objetivo das “Thinking Fashion” é pensar sobre a moda de uma forma transversal. A sua importância, os intervenientes, a busca pela relevância nacional e internacional, até a maneira como é capaz de mudar a vida das pessoas.

Ao longo os próximos tempos, as “Thinking Fashion” surgirão sob a forma de entrevista digital. Uma seleção de pensadores que serão postos à prova. O resultado é o somatório de diversas reflexões e perspetivas sobre a moda, este organismo dinâmico e multidimensional por natureza.

Assim, deixamos a entrevista digital a Sofia Moser Leitão, manequim.

As apresentações estão feitas. Agora, é só pensar.

 

1. Não podemos falar de moda sem falar de tendências. Segues alguma?

Nunca gostei muito da palavra “tendência”. Acredito que cada pessoa deveria criar as suas próprias tendências. Não sou muito a favor do comportamento de manada.

 

2. O sucesso na moda vem do trabalho, da sorte, ou de alguma conjugação de fatores tipo one in a million?

Acho que vem de uma combinação entre trabalho e sorte, mas acho que o empenho, a dedicação e a disciplina são sem dúvida meio caminho andado. Não podemos estar sentados à espera que as coisas aconteçam.

 

3. Para verem o seu trabalho reconhecido, os designers precisam da imaterialidade dos conselhos ou de pessoas que comprem a sua roupa?

Não sou designer, mas se fosse, adoraria saber que as pessoas se interessam pelo meu trabalho, mas que esse interesse não passasse só de curiosidade e entusiasmo. Os designers não sobrevivem do ar, é preciso apoiarmos, é preciso consumirmos peças de designer. Por isso é que tento sempre privilegiar comprar peças de designers independentes e de marcas em que eu sei que o meu apoio vai fazer a diferença.

 

4. Há quem diga que a moda é uma forma de arte. Mas há quem defenda que é uma arte menor. Será o quotidiano inimigo da contemplação?

Eu acho que existe moda que é arte e moda que não o é. Tanto como há pintores que são artistas e outros que não tanto. Fotógrafos artistas, e fotógrafos não-artistas. Chefes que são artistas e outros que nem por isso.
E na maioria das vezes acho que isso até se distingue por uma conversa, não tanto pelo resultado e a concretização do trabalho.
E não acho que o quotidiano tenha que ser inimigo da contemplação. Se formos expostos a uma peça interessante, acho que vamos ter sempre um olhar diferente quando formos confrontados com ela. A ideia é termos sempre perspectivas diferentes e vermos sempre coisas novas.

 

5. Porque é que alguns designers portugueses têm tanta dificuldade em viver da sua profissão principal?

Porque o poder de compra em Portugal não é propriamente colossal, e também porque as pessoas não têm muito bom gosto, e preferem investir numa peça com um logo reconhecível por todos, para garantirem que sabemos todos de onde vem a peça. Ninguém quer saber dos designers portugueses, infelizmente.

 

6. De que forma é que a indústria pode aproximar-se da moda de autor? Ou o caminho deve ser feito ao contrário?

Eu acho que para haver maior destaque da moda de “autor”, temos que ser nós consumidores a unir forças para mudarmos as coisas. É importante caminharmos nesse sentido, até a nível de ecologia e sustentabilidade.

 

7. Se juntares cinco ou seis peças de uma loja de fast fashion consegues comprar uma peça de alguns designers portugueses, que tem mais qualidade e é muitas vezes única. Há pudor, preguiça ou falta de interesse em comprar português?

Acho que é isso tudo ao mesmo tempo. Mas sobretudo ignorância e falta de sensibilidade.

 

8. A sustentabilidade mudou o paradigma da moda?

Acho que existe uma maior consciência geral mas é importante estar atento ao fenómeno do “green washing”.

 

9. Muitas pessoas querem ir aos eventos de moda em Portugal. 95% dessas mesmas pessoas nunca compraram moda portuguesa. Qual será o interesse, então?

Ver e ser vistos?!

 

10. Ainda faz sentido haver Semanas da Moda no formato tradicional?

Não acho que faça muito sentido. Acho que os gastos são muitos e o retorno não é assim tanto. Eu sou super a favor do digital. Os desfiles e eventos são na maioria das vezes uma feira de vaidades. Eu digo isto mas adoro ser convidada e vou com imenso gosto!

 

11. Por culpa de uma pandemia houve um crescimento do digital. Era preciso as lojas físicas terem fechado para se apostar nas lojas online?

Acho que sim. A pandemia teve um impacto muito grande a todos os níveis na indústria da moda. Fecharam muitas lojas mas também houve um consumismo online desenfreado. O que também não é ideal.

 

12. Como é que se consegue pensar a moda em Portugal?

Eu acho que a moda em Portugal é pouco representativa do talento que existe no nosso país. E acho que isso é uma pena.

 

13. Haverá uma “cultura de alienamento” propositada em relação ao que são as conquistas dos designers portugueses no estrangeiro?

A Marta e o Paulo dos Marques’Almeida, o Felipe Oliveira Baptista, a Constança Entrudo, entre outros, fizeram e continuam a fazer um percurso fantástico e conseguiram destacar-se no estrangeiro mas parece-me que realmente existe pouco reconhecimento disso em Portugal. E infelizmente acho que isso é uma das razões pelas quais os designers com talento têm que se virar para fora.

SOFIA DE MOSER LEITÃO

SOFIA DE MOSER LEITÃO

Fashion Model
Portugal
PT